quinta-feira, 4 de agosto de 2011

História de aeroporto

Quanta pressa para voltar para casa. Cansaço, preguiça, fome, saudade. Vôo atrasado. Passageiro passa mal e aeronave não pode decolar em minha direção enquanto ele não for atendido. Tinha que passar mal? Eu devo ter a sorte de ter tanto azar. O salto já descolou dos pés. Já sentei e já perdi a paciência. Quando estava pronta para desconectar daquela situação, uma senhora me pergunta:

Vai para Salvador?

Diante da minha afirmativa, ela disse que também iria. E eu encerrei o assunto com um:

Legal! :)

Não queria papo, mas ela insistiu:

Estou tão nervosa...

Percebi que ela queria uma escuta e resolvi ficar por ali. Dei o primeiro passo para uma história surreal que eu vou dividir com vocês:

Eu nunca viajei de avião, estou morrendo de medo. E foi só eu marcar a viagem que caiu um avião aqui em Recife, você viu?

Vi, sim, mas ele não caiu. Na verdade, nem chegou a decolar. Foi um problema técnico, na estrutura, não sei ao certo, mas fique calma... É mais fácil acontecer um acidente com a senhora em um ônibus do que em um avião! E, no mais, viajar de avião é tranquilo... É rapidinho, você vai ver! Em que poltrona você está?

Na 24... E você?

Na 22! Pronto, vai ficar perto. Qualquer coisa, você grita!

Tá! Obrigada!!

(alguns minutos depois...)

Não é só medo de avião. Estou nervosa porque estou indo me encontrar com alguém que procuro a mais de 40 anos. Estou indo para Salvador fazer um teste de DNA para saber se somos parentes.

Se são irmãs?

Não, se ela é minha filha.

(me espantei na hora e ela emendou)

Olha a cara dela! (e caiu na gargalhada)

Nossa, que pressão! Até eu fiquei nervosa, quero ver esse encontro! Como foi isso?

Quando eu tinha 12 anos, eu fui violentada e engravidei. Naquela época, gente de interior, minha mãe disse que eu tinha que casar com ele. Ele tinha 60. Me casei e 9 meses após minha filha nascer, ele tentou fazer aquilo de novo, mas eu já estava mais espertinha. Fugi nua para o mato e passei a noite inteira em pé, com cobra passando por mim, bicho me mordendo, imóvel. Quando amanheceu, vi que ele saiu para me procurar. Entrei em casa, vesti uma roupa, roubei minha filha e fui para a casa de minha mãe. Contei a ela, deixei meu bebê lá e pedi dinheiro para fugir para Recife. Quando cheguei aqui, minha mãe disse que ele havia passado lá, pego minha filha e ido embora. Soube que ele dava ela para as pessoas e depois pegava de volta, dava e pegava de volta. Por isso nos perdemos.

E como você achou ela??

Não achei. Minha família, uns parentes meus, estava no interior e a viu, conheceu ela e, após ela contar a sua história, acharam muita coincidência. Contaram para ela sobre mim e trocamos contato. Desde então, ela me liga todos os dias, me chama de mãe, me trata com tanto carinho. Estou indo para lá ver se é minha filha mesmo. Se for, vou gostar. Se não for, tudo bem também. 44 anos... Ela tem 44 anos hoje.

A senhora só tem ela?

Não. Lá em Recife eu encontrei um homem maravilhoso e somos casados. Tive seis meninos com ele. Depois adotei três meninas para ver se preenchia o vazio da minha filha. Nunca funcionou.

Que loucura!! Estou besta com a sua história!



Ela riu, o comissário nos chamou, ficamos em fila, entramos no avião, sentamos e ela foi tranquila para Salvador. Quando chegamos, eu não tinha mala para pegar, pois a minha era pequena e embarcou comigo. Fui saindo pelo portão para procurar meu pai e vi uma senhora com as mãos recolhidas no peito e uma menina ao seu lado, alisando seu braço e dizendo "calma, mãe." Voltei para onde as malas estavam sendo entregues e disse a ela:

Não precisa de DNA, ela é sua filha! É a sua cara!

E ela largou um sorrisão!

O encontro foi lindo! Emocionante! Se abraçaram, choraram. Ela nos apresentou, eu, minha tia e minha mãe, a "suposta" filha e neta! Emoção dupla! Nos despedimos e elas seguiram abraçadas pelo aeroporto. Em direção a uma nova etapa, tenho certeza!


Resta dúvida?


3 comentários:

  1. Que lindo Isa,

    Me emocionei mesmo, viu?

    Quando vi o título, só lembrei do programa de Astrid Fontinelli e depois que li... é praticamente o "Chegadas e partidas".

    Boa sorte às duas, que dê tudo certo. só não tenho certeza se elas são assim tão parecidas...

    beijos

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  2. Estava lá e pude constatar, são bastante parecidas, sim !!! Quando vi a 'filha', eu disse para ela: Já sei quem é a sua filha, ela está alí,com sua neta,nem precisa fazer DNA.E o melhor: além da filha, ela ganhou neta e bisneta, tudo de uma só vez !!!

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  3. ta vendo? entre um onibus e outro, um avião e outro a gente consegue aprender muito com as pessoas que estão por perto. amo isso!

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